‘Batman – O Cavaleiro das Trevas’ completa 10 anos e vê força de legado aumentar
As discussões morais, o vilão assustador e apaixonante e a escala épica e sombria que redefiniu todo um gênero são principais credenciais do longa-metragem de Christopher Nolan que comemora aniversário de dez anos
Por mais que a internet goste de exagerar, não são feitos muitos filmes atualmente que mereçam a outorga de obra-prima. Mas quando eles surgem o impacto é tão imediato quanto perene. Por muitas razões, é seguro dizer que “Batman – O Cavaleiro das Trevas” veste a carapuça.
Heath Ledger em Batman – O Cavaleiro das Trevas; uma das cenas mais icônicas de um filme cheio delas
Foto: Divulgação
Lançado em 18 de julho de 2008 com uma bilheteria de estreia de US$ 158, 411 milhões, a época a maior de todos os tempos, “Batman – O Cavaleiro das Trevas” mudou profundamente o status quo do cinema.
O filme de Christopher Nolan encerrou sua carreira no cinema com mais de US$ 1 bilhão em caixa. Foi o primeiro filme baseado em HQ a fazê-lo, um mérito que jamais poderá ser superado. Foi também o filme que fez com que a crítica percebesse o potencial narrativo e dramático desse gênero, então embrionário, que começava a despontar em Hollywood com força total. A Marvel lançara o primeiro “Homem de Ferro” alguns meses antes naquele mesmo 2008.
Visão de autor
Christopher Nolan no set de Batman – O Cavaleiro das Trevas
Foto: Divulgação
Christopher Nolan, que havia causado sensação com “Batman Begins” (2005), fora muito criticado quando anunciara Heath Ledger como sua escolha para viver o Coringa. Mas o ator calou a todos com sua personificação alucinada, caótica e profundamente ressonante do palhaço assassino.
A morte precoce do australiano, em virtude de overdose acidental, meses antes da estreia do filme mudou para sempre a percepção em torno do longa-metragem, mas o trabalho de Ledger foi tão autoral e comungado com a visão de Nolan que soa arbitrário e simplório creditar a sua morte a celebração em torno de sua performance. A performance de uma vida, para todos os efeitos.
A crítica apressou-se em definir o filme como um encontro de “O Poderoso Chefão” com “Fogo contra Fogo”. As referências demonstravam que “O Cavaleiro das Trevas” não estava no patamar tradicional dos blockbusters de verão. Nolan, que também escreveu o roteiro ao lado de seu irmão Jonathan, já havia estabelecido os parametros realistas de sua Gotham e de seu homem-morcego, mas a segunda parte de sua trilogia trazia um bem-vindo comentário político, um indesviável olhar sobre a existência e reverberações psicológicas entusiasmantes.
Chicago virou a Gotham de Christopher Nolan em O Cavaleiro das Trevas
Foto: Divulgação
Não obstante, o filme é um triunfo do ponto de vista da ação. Além de ter tido cenas filmadas com câmeras IMAX, “O Cavaleiro das Trevas” viabilizava suas cenas de ação como correntes de tensão para os personagens e os diálogos como focos de ação. A cena de abertura pavimenta esse raciocínio com uma combinação, ainda ímpar no cinema, de estilo e narrativa.
Prêmios e status quo
A Warner ainda sofre para se desvencilhar da sombra projetada por este filme sobre todos os outros de heróis da DC que vieram depois dele. Se não é algo exatamente lisonjeiro, é um reconhecimento tácito da influência da obra de Nolan. O filme seguinte, inclusive, descarrilou. “O Cavaleiro das Trevas Ressurge” (2012) é tão comum, banal e insuficiente que passa à posteridade como um filme ruim. Como curiosidade, o coringa deveria ser o vilão principal do terceiro filme. Nolan precisou reorganizar a estrutura do filme em virtude da morte de Ledger.
O maior feito do longa do ponto de vista de movimentar o status quo hollywoodiano foi, no entanto, mudar as regras da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que anualmente entrega o Oscar. Havia um consenso absurdo entre indústria e crítica que “O Cavaleiro das Trevas” era o melhor filme do ano. Apesar das oito indicações ao Oscar, o filme não foi lembrado entre as melhores produções do ano. A reação foi intensa e barulhenta. A Academia resolveu ampliar as vagas na categoria de melhor filme na expectativa de conseguir incluir produções mais populares e dirimir todo o mal-estar provocado pela exclusão da única obra-prima que 2008 viu nascer.
O filme é uma discussão moral em si e o protagonista é constantemente desafiado a fazer decisões existencialmente difíceis
Foto: Divulgação
“Batman – O Cavaleiro das Trevas” dispensa adjetivações adulatórias para reafirmar sua posição na cultura pop e no imaginário do cinema contemporâneo. É um filme de força renovável e méritos muitíssimo bem compartimentados. É o filme que transformou adaptações de HQ em um gênero em si. É um filme cujo legado em 20 anos será maior do que já é em dez.